Alojamento local: Problema global, solução nacional?

O alojamento local tem estado na ordem do dia e as questões que levanta não são exclusivas de Portugal. Contrariamente ao que se possa pensar, esta não é uma atividade que só agora tenha surgido. Artur Filipe da Silva, especialista da BAS em direito imobiliário, faz aqui uma reflexão sobre o tema.

 

Já para não falar nas, por quase todos nós relembradas, placas a anunciar “Chambres, rooms e zimmers”, a verdade é que o alojamento local já existe há algum tempo e, aliás, já se encontra regulamentado como enuncia o preâmbulo do Decreto-Lei n.º 128/2014, de 29 de agosto (na redação atual que resulta do Decreto-Lei n.º 63/2015, de 23 de abril e que estabelece o regime jurídico da exploração dos estabelecimentos de alojamento local), “A figura do alojamento local foi criada pelo Decreto-Lei n.  39/2008, de 7 de março, alterado pelos Decretos-Leis n. s 228/2009, de 14 de setembro e 15/2014, de 23 de janeiro, para permitir a prestação de serviços de alojamento temporário em estabelecimentos que não reunissem os requisitos legalmente exigidos para os empreendimentos turísticos.”

 

Duas correntes

Com efeito, trata-se de um tema que recentemente tem sido alvo de um grande debate em muitas das cidades dos países desenvolvidos e, naturalmente, também em Portugal e que tem merecido a atenção da sociedade civil e dos poderes públicos.

Efetivamente, existe uma corrente de opinião que sustenta que o alojamento local tem contribuído para estimular a economia, muito particularmente permitindo a alguns empreendedores e pequenos investidores, o desenvolvimento de uma atividade complementar da oferta turística tradicional e que, ao mesmo tempo, tem sido o motor da reabilitação urbana em muitas cidades portuguesas.

Em posição diametralmente oposta, noutra corrente, encontram-se aqueles que entendem que esta atividade está a expulsar os moradores das suas próprias cidades, a pôr em causa o mercado de arrendamento, a impor aos demais proprietários dos imóveis uma ocupação que, em alguns casos, sustentam, não tem respaldo no título de utilização para habitação e, ainda, a contribuir para a existência de um indesejável número descontrolado de turistas que, em última análise, levaria à descaracterização das cidades.

 

A experiência de outros países

Os argumentos a favor e contra ao alojamento local estão bem identificados, mas a verdade é que existe uma necessidade de intervenção ao nível regulatório e, aparentemente, até nos projetos legislativos cujos termos têm vindo a público, a falta de consenso é evidente.

E, como muitas vezes acontece, podemos tirar algumas ilações das experiências de outras cidades que, confrontadas com o mesmo problema, já intervieram.

Assim, e numa viagem necessariamente sucinta por alguns casos paradigmáticos, podemos verificar que na Alemanha, mais concretamente nas cidades de Berlim, Hamburgo e Munique, legislou-se no sentido de proibir o arrendamento de imóveis para habitação a turistas, considerando que tal seria um “uso inadequado” e estipulando coimas que podem ascender aos 100 mil euros.

Aqui mesmo ao lado, em Espanha, a questão tal como em Portugal, ainda não está clara em todas as comunidades autónomas, que têm competência de decisão nesta matéria. As soluções preconizadas vão desde a simples proibição de novos alojamentos (como em Barcelona) ou a obrigatoriedade de estabelecer nos regulamentos dos condomínios a proibição do exercido daquela atividade e, ao mesmo tempo, estabelece um limite de 75% das frações que num edifício podem ser afetas à atividade de alojamento local, sendo que quando esse edifício pertença a um único proprietário, a percentagem baixa para 50%, e ainda o estabelecer de um rácio de pessoas em função das dimensões do imóvel, como é o caso de Madrid.

Em França, existe uma distinção entre os imóveis que são para habitação própria e os demais imóveis. Quanto às habitações próprias, estas podem ser arrendadas a turistas por um período até 120 dias por ano e uma vez atingido esse limite, têm de deixar de ser publicitadas como tal, as demais para que possam ser arrendadas necessitam de alteração do seu uso, em ambos os casos as coimas são elevadas.

 

A solução para Portugal

Em Portugal, encontram-se em discussão na Comissão de Ambiente, Ordenamento do Território, Descentralização, Poder Local e Habitação cinco projetos de lei dos diferentes quadrantes políticos referentes ao alojamento local, os quais podem ser consultados aqui.

Cá, como lá, tem-se procurado o equilíbrio entre os prós e os contras do exercício da atividade de prestação de serviços de alojamento local.

O amadurecimento das soluções inicialmente propostas, que indiciam que estão a ser dados passos no sentido de um equilíbrio entre os vários interesses em presença é evidente.

Assim, é com expectativa que esperamos que o nosso legislador possa colher os frutos das experiências em curso noutros países, que sendo também muito recentes ainda não permitirão conclusões definitivas sobre os seus efeitos no mercado e na vida das pessoas, esteja particularmente atento às situações atualmente existentes e não traga soluções que possam pôr em risco a confiança que aqueles que investiram na recuperação de imóveis destinados ao alojamento local tiveram no quadro até hoje vigente.

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